Paulo Lopes

21 de 04 de 2021, 16:43

Cultura

De Abril a Ernesto

Falar de abril é falar da reabertura das salas de espetáculos. De como se fez e como se prepara o futuro no Teatro Viriato. É também falar do artista mulltidisplinar Ernesto de Sousa que, a 18 de abril, celebraria 100 anos.

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Há dias em que não há tempo para escrever. Mas são dias como estes que dão um sentido à nossa escrita e à nossa vida diária num teatro.
Este dia começou há uns largos meses num certo encontro. Um encontro de druidas entre o Museu Grão Vasco, o Agrupamento de Escolas de Moimenta da Beira e o Teatro Viriato. Falámos de pintura de género, de arte nas escolas, de construção de imagens. Congeminámos um plano: e se começássemos este projeto teatral onde se misturam artistas, professores e alunos com uma visita guiada a uma exposição temporária ainda por terminar e uma visita a um teatro ainda fechado, mas já com ensaios para uma estreia? Queríamos que os alunos do agrupamento de Moimenta da Beira se encantassem com os bastidores dos museus e dos teatros. Que descobrissem o fascínio da criação através do processo criativo. Queríamos que os nossos museus e os nossos teatros fossem lugares domésticos para estes alunos durante os próximos meses, que saíssem deste projeto a querer adotar estes lugares como se fossem as suas bibliotecas, as suas salas de estar, os seus recreios. Terminámos este encontro, a meio de uma primeira e feroz quarentena a dizer: mas isto vai mesmo acontecer, não vai? Vamos mesmo fazer isto acontecer?
Este dia também começou no aniversário da arte a 17 de janeiro, quando homenageámos Ernesto de Sousa, o padrinho da nossa programação para 2021. Este domingo, 18 de abril, este artista multidisciplinar inclassificável faria 100 anos. Ao escolhermos Ernesto como nosso padrinho, queríamos estar à altura da sua obra, e queríamos fazer-lhe a promessa de apresentar uma programação que estivesse à altura do seu espírito pluridisciplinar.
Este dia também começou no sábado passado, com a abertura do nosso ciclo de música a Galeria Zé dos Bois, escolhido a dedo e pela mão de Sérgio Hydalgo. Ricardo Toscano estreou o seu double Trio e com a sua música aqueceu o Teatro, preparando-o para a sua abertura esta segunda-feira, dia 19 de abril, dia em que podemos reabrir o nosso espaço ao público.
Este dia de reabertura só poderia ser este dia que começou a ser cozinhado por tantos e há tanto tempo. Abrimos as portas do teatro à mais nobre das atividades públicas: Uma visita guiada aos bastidores do teatro oferecida por toda a sua equipa aos alunos do agrupamento de escolas de Moimenta da Beira. Com direito a assistirem à montagem do cenário do espetáculo em residência “Ainda estou aqui” de Tiago Lima, vencedor da 3º edição da Bolsa Amélia Rey Colaço. E uma outra visita à exposição temporária sobre a identidade portuguesa ainda em construção no Museu Grão Vasco. E ainda uma pausa no Adro da Sé onde jogámos e conversámos juntos, guiados por Nuno Veiga, artista associado do Teatro Viriato, numa pequena sessão com direito à história múltipla da Sé de Viseu contemplando os seus vários séculos de construção. Ainda a semana vai a meio, e já sabemos que teremos direito a assistir aos ensaios de uma banda de Tiago Lima que, finalmente, poderá ver a luz do dia durante os próximos ensaios, e ainda poderemos celebrar a revolução este fim de semana, descendo a avenida, relembrando como, e a partir de Viseu, a descemos o ano passado através do olhar e dos telefonemas em direto de Joana Craveiro, nossa artista residente. Ah, e isto sem esquecer o concerto dos professores do Conservatório de música de Viseu já este sábado no Festival Internacional de Música da Primavera. Tudo isto numa semana e penso: Haverá melhor semana e maneira de reabrir um teatro do que desta maneira? Querido mestre Ernesto de Sousa, queridos parceiros do Museu Grão Vasco e de Moimenta da Beira, haverá melhor do que misturar séculos, técnicas, estilos, casas, idades e vontades para reabrir um teatro e celebrar a multiplicidade do que ainda podemos ser?

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Patrícia Portela, diretora artística do Teatro Viriato