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Sofia Pereira
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Aldeias vazias com gente dentro

 Aldeias vazias com gente dentro
31.07.21
fotografia: Jornal do Centro
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 Aldeias vazias com gente dentro
15.12.24
Fotografia: Jornal do Centro
 Aldeias vazias com gente dentro

“Mesmo não tendo muitos habitantes eu gosto de morar aqui”. A afirmação é de Íris Domingues, uma das habitantes mais novas da aldeia de Granjinha, no concelho de Tabuaço. Íris tem 11 anos, nunca viu a terra onde nasceu cheia de gente como em outros tempos. Já chegaram a morar na Granjinha 307 pessoas, hoje são 29, três delas são crianças com 10, 11 e 12 anos.

“As pessoas foram embora porque se calhar não gostam disto. Preferem as cidades grandes. Eu prefiro as aldeias, em especial a Granjinha”, conta Íris com um brilho nos olhos enquanto fala das suas raízes.

A União de Freguesias de Paradela e Granjinha é a que mais população perdeu nos últimos dez anos em todo o distrito de Viseu. É, aliás, das freguesias mais pequenas de Portugal continental. Segundo os censos 2021, divulgados recentemente pelo Instituto Nacional de Estatística, na última década a freguesia perdeu 45 por centro da população. Em 2011 eram 180 moradores, atualmente são 99.

Se Íris é uma das habitantes mais novas da Granjinha, Domitilia Augusta é a mais velha da aldeia, completou em fevereiro 94 anos. Ao contrário da sobrinha, Domitilia tem bem presente na memória os tempos em que o silêncio dos dias de hoje era trocado pelo barulho de uma terra com gente. “Era uma terra alegre, faziam-se aí bailes todos os domingos. Agora não há nada”, conta de olhar fixo no horizonte.

Sentada nas escadas junto à entrada de casa, onde mora com a nora, conta-nos que a idade já não lhe permite grandes passeios, até porque nunca saiu da aldeia, mas sempre que pode dá uma “voltinha” pela rua. “Às vezes vou ali até à fonte e fico lá sentada, sempre vou passando o tempo”, diz.

Tempo que por ali parece passar mais devagar, sem pressa, sem a agitação de uma vida de afazeres na cidade. E a verdade é que não há muito que fazer ou para onde ir, Tabuaço fica a cerca de 10 quilómetros. Não há cafés, mercearias, parques para os mais novos ou zonas de convívio. Ainda assim, “há muito para fazer na Granjinha, muita terra para cavar. Só não faz quem não quer!”, conta Maria dos Anjos Santos, que mora na aldeia há 60 anos.

E quando lhe perguntamos se ainda se lembra da Granjinha com muita gente, Maria dos Anjos sustem a respiração mas não consegue conter as lágrimas. “Antes era uma alegria. Tinha tanta gente e agora não tem ninguém e isto custa-me”, diz.

Visitámos a aldeia na companhia de António Ribeiro, antigo presidente da Junta de Freguesia da Granjinha e, ainda que natural de Marco de Canaveses, habitante da aldeia há mais de 60 anos. “A Granjinha é boa, uma terra bonita mas a lei da natureza é isto. As pessoas vão embora à procura de melhores condições de vida, porque aqui não se governam. E com os mais novos a irem embora e só os os reformados a ficarem, daqui a uns anos já não há nada aqui. Nem aqui nem em outras aldeias como a nossa”, admite.

Julieta Pinto tem 86 anos, em setembro completa os 87, sentada num banco avisa-nos que não pode demorar muito porque o almoço tem que ser feito. Diz sentir-se bem na aldeia onde toda a vida viveu. “Sinto-me cá bem, gosto do sossego mas claro que era bom se houvesse mais gente”, conta enquanto aponta para uma casa ao fundo. “Quando frequentei a escola éramos 30 alunos, havia primeiro, segundo, terceiro e quarto ano”, remata.

A aldeia da Granjinha até pode ter pouca gente mas recebe todos os anos centenas de visitantes. A “culpa” é da Igreja de São Pedro das Águias, situada numa falésia com o rio Távora aos pés, uma verdadeira jóia do românico português. Só este ano, quase 300 pessoas visitaram aquele local e também o Mosteiro.

Meia dúzia de quilómetros separam a Granjinha da outra aldeia pertencente à freguesia, a aldeia de Paradela. Também aqui as ruas são invadidas por um silêncio que nos mostra que foram muitos os que saíram daqui. Com 70 habitantes, Paradela é mais uma aldeia vazia mas com gente dentro.

Encostada na entrada de casa, Maria desabafa que por ali já não se vive bem, sobretudo porque não há transportes, mercearias, cafés ou outros serviços. Vive em Paradela há mais de 70 anos. “Antes havia muita gente, era uma alegria, tabernas tínhamos umas quatro ou cinco, mercearias, cafés, agora tudo fechou, tudo saiu daqui. Precisávamos de algumas ajudas, que nos dessem mais atenção”, disse.

Na aldeia há atualmente oito crianças, uma delas ainda bebé. De olhos arregalados observa-nos, brinca descalça e já ao colo da mãe encosta-se. Uma paz que combina com a terra que o verá crescer.

Por fim falamos com Secundino Soeiro e António Soeiro, contam-nos que por ali não se passa nada “nem o Covid cá andou, graças a Deus”, atiram.

Secundino Soeiro lembra que na aldeia sempre se viveu da agricultura e hoje não é diferente. Já António Soeiro, que nasceu em Paradela mas que esteve fora no Brasil durante 30 anos, lembra os tempos antigos em que a vida já não era fácil mas que agora “ainda está pior”. “Antes ainda tínhamos cafés e outras coisas agora estamos pior, que não temos nada. Portugal esqueceu-se de nós”, desabafa.

A freguesia de Paradela e Granjinha perdeu em dez anos 45 por cento da população, quase metade dos habitantes. Embora praticamente vazias, vítimas do êxodo rural e do Interior esquecido, a verdade é que estas não são aldeias ao abandono, estão arranjadas, cuidadas e rodeadas por uma beleza ímpar. Aldeias que, embora vazias, têm quem faça lembrar que ali ainda mora gente.

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