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Acordei com a Fátima ao meu lado. Mal acreditei na aparição, tão bela me pareceu, os olhos com um brilhozinho de lágrima contida, os cabelos a roçarem-me o rosto, as mãos agarradas às minhas, de joelhos para mais próxima estar de mim, que tinha resvalado para cima da mochila com o sono. «Oh!, meu amor» foi a primeira frase, repetida várias vezes, que lhe ouvi. Eram as palavras, as únicas, que de momento precisava. De mais nada carecia, de nenhum ouro deste mundo, de nenhum poder, de nenhum alimento. Tão só aquelas palavras e a ordem da vida estava restabelecida.
Depois dos beijos, depois do abraço prolongado e de outros beijos, expliquei-lhe a minha vinda. O sentido da vida concentrou-se naquele momento. O resto, todo o resto, as distrações do ano, os estudos, as angústias, as amizades, anulavam-se perante aquela presença cheia da plenitude do ser. Era nela que se enraizavam o mistério e a graça, o fundamento e o futuro da minha vida. Isto escrevo eu agora, num café aqui ao lado do lugar da feira da ladra. A Fátima voltou ao trabalho e combinámos que esperaria aqui pela hora de almoço dela. Mas decidi sentar-me num dos bancos do Jardim de Santa Clara. Com o caderninho do diário aberto, a caneta na mão, e o olhar cheio da paisagem que, por um dos lados, se alonga até o rio, registo este cenário, que integra o Panteão Nacional, o Casão Militar, o jardim, a feira da ladra, como o originário do ato poético que é o nosso amor. Aqui demos os primeiros passos juntos, o primeiro beijo, as primeiras palavras, aqui um anjo, talvez vindo da rua do Paraíso, tão perto, nos tocou com as suas asas e a sua sombra.
Vejo-a neste momento a sair do edifício. É ela, o meu amor. Distingui-la-ia no meio de uma multidão. Os cabelos soltos sobre os ombros, o rosto moreno, o andar decidido e elegante, o pescoço alto a destacar-se da blusa bordeaux de mangas cavas, e as jeans azuis. Observo-a, contemplo-a. Aproxima-se do café, olha as mesas, interroga-se, não lhe faço nenhum sinal, para prolongar o momento de admiração estética e afetiva. Mas descobriu-me. E num instante o seu sorriso se alarga e se estende ao rosto e ao próprio movimento do corpo. Fecho o caderninho.
Quando chegou, quase se atirou ao meu colo, colocando um dos braços por trás do meu pescoço, e beijando-me. E disse-me que tinha uma surpresa e um plano.
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Margarida Benedita
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