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Entretanto, vou seguindo o meu curso de línguas e dou explicações de filosofia a uma estudante do curso noturno, num café. Em breve, iniciarei também explicações a uma jovem senhora viúva que pretende completar o ciclo preparatório. No campo social, vou ganhando mais confiança em mim próprio, agrada-me e comove-me a amizade que outros me dedicam. Com a minha professora de inglês desenvolvi uma amizade que muito me encanta: sabe bastante de literatura, adora música clássica. Mostrei-lhe alguns poemas meus. O professor de francês é também muito novo, uns vinte e tal anos, estudou clandestinamente em França durante vinte e dois meses.
Afinal, passei os exames de aptidão. Houve muita reprovação. Foi uma sorte, pois não tinha estudado, revoltado com esta imposição de última hora. Mas não sei. Mesmo que consiga uma vaga na faculdade, sem uma bolsa de estudo não vai ser possível frequentar uma universidade. Entretanto, obceca-me o desejo de partir.
Partir. Viver. Amar. Desta santa trindade fazer a descoberta do mundo. Acima de tudo, a presidir às nossas vivências, deve estar a autenticidade. De mim para ti. De mim para todos. E reciprocamente. Não pode existir limitações para a criatividade. E o poder criativo caldeia-se na experiência, na liberdade, no amor. Mas não no amor egoísta. Este é como um canivete a anavalhar Deus em cada homem. Deus é o espírito criativo. A força que me faz irmão dos outros, que me liga, envolve, impulsiona a dar-me aos outros. É a pureza, a verdade, os sentidos que habitam em nós.
6 de janeiro de 1978
Continuo à espera. Ansioso por partir, iniciar a construção do meu futuro. Por enquanto, é só raiva, angústia, solidão, leituras, cigarros e murros de revolta.
Matriculei-me em filosofia em Lisboa, por causa da Fátima. Mas por motivos económicos, tenciono ir por meio ano a Jersey trabalhar num hotel e só posteriormente continuar os estudos. Não sei, no entanto, se consigo licença militar. Ando farto destas cenas burocráticas: desesperam, enrodilham, não avançam. Anseio por paz, autonomia, serenidade, já não aguento esta pedalada da indecisão, do nem ata nem desata. Continuo à espera.
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Carolina Ramalho dos Santos
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