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A Escola Alves Martins, que foi um dos primeiros liceus em Portugal, é pioneira a introduzir a Língua Gestual Portuguesa (LGP) no currículo como disciplina opcional para os alunos do 12º ano.
A disciplina foi implementada no ano passado pela primeira vez com duas turmas. Este ano, o interesse cresceu: cerca de 75 alunos, divididos em três turmas, optaram por aprender esta língua. Com a consciência de que ainda há barreiras que precisam ser derrubadas, o objetivo é ganhar ferramentas para integrar aqueles que não utilizam a fala para se expressar.
Adelino Azevedo Pinto, o diretor da escola, está envolvido neste projeto desde o início. Com ele em marcha, demonstra-se orgulhoso da resposta que os alunos deram a esta opção.
O diretor acredita que esta ferramenta prepara os jovens para o mundo de forma mais inclusiva ficando “com a certeza que poderão comunicar com alguém que em certa medida tem um entrave, ou alguém que se cruze com eles na rua e precise de alguma coisa.”
Nem sempre foi assim. O caminho que a Escola Alves Martins tem feito para garantir a inclusão não se resume à opção desta disciplina.
Há cerca de oito anos, os alunos surdos “chegavam ao nono ano e tinham de ir estudar para Ílhavo”, relembra o diretor.
Devido à pressão exercida pela escola junto do Ministério da Educação, foram criadas as condições necessárias na Alves Martins para evitar que os alunos surdos tivessem de se deslocar, tornando a escola uma referência para a comunidade surda no panorama nacional, chegando a ter “uma aluna que veio de propósito de Lisboa porque tinha boas indicações”, segundo o diretor.
“O que se fazia na escola de Ílhavo passou a fazer-se aqui. Temos um caso de um aluno que acabou agora engenharia eletrotécnica, teoricamente não ia conseguir seguir estudos”, comenta Adelino Azevedo Pinto.
A experiência da professora
A Língua Gestual Portuguesa tornou-se a língua oficial da comunidade surda em Portugal em 1997. Para ensinar esta língua tão especial, a escola conta com uma professora surda, que tem o apoio de uma intérprete na sala de aula e que foi quem nos conduziu nesta reportagem.
A docente, Cláudia Silva, já trabalhou em associações de surdos, mas confessa que ensinar a sua língua a jovens é algo que a deixa “mesmo muito feliz”.
Sentido na pele os entraves de não conseguir comunicar através da fala, a professora considera que esta aprendizagem é uma forma de abrir portas à comunicação com a comunidade surda.
“Imaginemos que estes alunos podem trabalhar numa loja e vir alguém surdo. É neste sentido que eles escolhem, a questão da necessidade, porque o surdo tem algumas barreiras, essencialmente a comunicação, e se soubermos o mínimo o atendimento vai fazê-los sentir melhor porque não há esta barreira com que normalmente lidam”, afirma a professora.
A docente acredita que a escola Alves Martins deu um passo importante na educação inclusiva, desejando que outras escolas do país sigam este exemplo, pois “a sociedade precisa de perceber que todos devemos saber o básico desta língua”.
O papel da intérprete
Vânia Campanhã, interpreta por voz o que a professora quer passar aos alunos com gestos, mas a intermediação não é uma constante.
“Na primeira aula, solicitei a presença do intérprete para explicar aos alunos como iria ser a dinâmica, mas, durante o ensino das aulas, os alunos têm toda a parte visual”, explica a professora.
A intérprete considera que este modo de ensino faz com que os alunos necessitem de estar mais atentos no que estão a ver, salientando que “se há algum sítio onde é possível ensinar isto é nas escolas.”
Os alunos: motivo e o impacto da escolha
Ter à disposição a Língua Gestual Portuguesa como opção de disciplina atraiu os alunos não só pela curiosidade, mas também para se aproximarem de quem não pode recorrer à voz para se expressar.
Matilde Mendes frequenta o 12º ano e foi uma das alunas que escolheu a Língua Gestual Portuguesa como opção. Os motivos remontam para a infância, quando teve pela primeira vez contacto.
“Na primária tive-a, não como disciplina, mas como atividade extracurricular, e porque havia uma aluna surda senti que saber coisas como dizer bom dia, era uma forma de mostrar que nos esforçávamos para comunicar com ela”, conta Matilde.
A um ano de ir para a faculdade, a jovem sonha ingressar em teatro. A estudante considera que a língua gestual pode ter um papel importante no curso, pois “há espetáculos em que os atores fazem a peça em Língua Gestual ao mesmo tempo, de forma a ficar mais inclusivo”.
José Carlos tem uma perspetiva mais pessoal para justificar a sua escolha. O jovem decidiu aprender a língua, pois sente que necessita de ferramentas para comunicar com um familiar surdo-mudo, vendo na disciplina uma esperança para “tentar construir um laço mais forte com ele.”
O aluno afirma que LGP não é apenas só mais uma disciplina, mas que “toda a turma tem mesmo gosto no que estamos a aprender” e salienta que “quem tem o entrave da fala não é menos que nós”. “Temos de nos ajudar uns aos outros e adquirir métodos para os integrar”, realça.
Modelo de educação bilingue e inclusiva
Cristina Fonseca, uma das responsáveis pelas atividades de inclusão na escola, destaca que a mesma segue uma ideologia de “educação inclusiva”, em que os alunos têm um acompanhamento especializado, independentemente das suas necessidades.
“Se somos uma escola de referência, temos que ter aqui uma cultura surda e uma cultura de educação bilingue”, explica.
A escola tem atualmente quatro alunos surdos, dois dos quais são acompanhados nas aulas por intérpretes que, segundo Carla, “estão perfeitamente integrados”.
Reconhecimento público
O trabalho que a Escola Alves Martins, em Viseu, tem desenvolvido na educação dos mais novos não passa despercebido. Na abertura deste ano letivo, a 12 de setembro, o Presidente da República anunciou que a escola vai receber uma condecoração com o título de membro honorário da Ordem da Instrução Pública, devido ao “que esta escola, desde que foi criada como liceu, fez pela educação em Portugal”.
A introdução da Língua Gestual Portuguesa no currículo da Escola Alves Martins é um exemplo que demonstra que todos, independentemente das suas necessidades, devem ter na escola um espaço para aprender e crescer.