Autor

Jorge Marques

04 de 05 de 2024, 15:09

Colunistas

A Mãe/Avó da Europa

Foi uma pena não ter sido feita Imperatriz da Europa, mas ficou para a história com esse título de Avó da Europa!

jorge marques

No próximo domingo (5 de Maio) celebra-se o Dia da Mãe! Por isso o título deste artigo pode parecer estranho, mas como se costuma dizer, a avó é uma mãe duas vezes. Neste dia quero homenagear uma mulher em particular e que foi mãe dez vezes. Com esses filhos e depois os netos sonhou unir a Europa através da sua barriga, sonhou uma União Europeia no Séc. XII/XIII. Foi uma pena não ter sido feita Imperatriz da Europa, mas ficou para a história com esse título de Avó da Europa! Mas há uma outra mensagem que eu queria deixar neste artigo, aquela que nos diz, que muitas vezes as avós estão mais na vanguarda da modernidade do tempo e das ideias do que as filhas ou netas. Quer dizer que houve espaços e tempo na História, onde a relação entre a Mulher e o Homem esteve ao mais alto nível. Quero dizer também que o Tempo não é linear e que já houve muitos avanços e recuos.
Essa Mulher/Mãe/Avó de que quero falar começou por se chamar Leonor da Aquitânia (1122-1204) e iniciou-se na governação aos 14 anos. Era neta de Guilherme IX da Aquitânia, o Primeiro Trovador, o seu educador, porque o pai morreu muito cedo. A Aquitânia era um Ducado Independente a noroeste da Europa e onde estão hoje cidades como Bordéus e Biarritz. O avô fez dela a Primeira Trovadora e deu-lhe uma educação com fluência em oito línguas, matemática, filosofia e astronomia. Naquele recanto da Europa e nesse tempo foi construída uma civilização do futuro. Havia igualdade de direitos entre homens e mulheres, tolerância religiosa, liberalismo de pensamento, liberdade no amor e tudo isto na Idade Média!
Aqui nasce a primeira literatura europeia na corte mais rica e culta da Europa. Fala-se de uma Igreja do Amor, do Amor Cortês, do direito das mulheres ao amar e serem amadas. Tudo isto, enquanto no resto da Europa elas estavam a ser queimadas nas fogueiras! Foi este o ambiente onde cresceu Leonor da Aquitânia, a mulher mais culta da Europa, mais culta do que todos os outros governantes da sua época. Em quantas vidas se divide a sua vida?
Casou duas vezes, com dois reis, o de França e o de Inglaterra e dos quais teve dez filhos. Espalhou esses filhos e netos pelas cortes europeias. Mãe de Ricardo Coração de Leão, matriarca da dinastia inglesa que nos deu Filipa de Lencastre e essa nos deu a Ínclita Geração dos Altos Infantes. Esses filhos e netos espalharam-se pelas cortes de Portugal, Espanha, Inglaterra, França, Itália, Alemanha, Áustria, Escandinávia. Era este o seu Sonho Europeu! Foi guerreira, vestiu-se de Cruzada e combateu o Islão na Terra Santa, ela e um grupo de mulheres da Aquitânia. Foi aí que se zangou com o primeiro marido, ela era mais valente que ele. Com o outro marido, Rei de Inglaterra, zangou-se por apoiar os filhos contra o pai. Esse prendeu-a num castelo por 16 anos. Foi guerreira também na luta pela liberdade das mulheres do seu tempo.
Como trovadora foi mãe do Amor Cortês e dos Tribunais do Amor. Eram Tribunais para julgar o cumprimento das Leis do Amor por parte de homens e mulheres. Não se falava de adultério, mas do cumprimento dessas leis. Eram tribunais dirigidos só por mulheres, julgavam conflitos e geravam jurisprudência. Uma das grandes questões que levou a muitas discussões tinha a ver com uma pergunta que ainda hoje se faz: É possível existir o verdadeiro e eterno amor no casamento?
Na sua vida há também uma relação muito próxima com os Templários, com quem esteve na Terra Santa. Fez-lhes uma grande campanha de angariação de fundos, doou-lhes o Porto de La Rochelle que se encheu de mistérios. Na noite em que os Templários começaram a ser presos por toda a França, na tal Sexta Feira 13 (Outubro), uma dúzia de barcos zarparam daquele porto. Dizem que levavam o Tesouro e os Segredos Templários. Partiram com aquelas velas brancas e a cruz encarnada, talvez para Portugal ou para mais longe! Parece que eles já navegavam por todo o Atlântico. Há quem diga que eles e Leonor comungavam do mesmo projeto europeu, eles que dominavam a economia e foram os primeiros grandes banqueiros da Europa. Ambos comungavam da espiritualidade, da liberdade, onde a Mulher tinha um lugar relevante na História. Ambos oravam a Maria Madalena na religião do Amor. Talvez por tudo isto Leonor seja considerada a grande figura europeia da Idade Média e por isso a lembro hoje no Dia das Mães.
Com a morte do segundo marido, Henrique II de Inglaterra, ela é libertada da prisão e o trono fica com o filho Ricardo Coração de Leão de quem chegou a ser Regente. Aos 80 anos olha à sua volta e percebe que trabalha desde os 14 anos. Pensou que era hora de descansar e fazer aquilo que não conseguiu toda a vida. Era ler os livros que queria ter lido e não leu! Recolhe-se então a um mosteiro para ler e escrever o que lhe ia na alma. A neta do Primeiro Trovador, a Primeira Trovadora quer ler livros, muitos, todos os que pudesse ler. Mas queria também dar uma última lição à Europa e à sua gente. Essa lição ficaria para além da sua morte e está escrita na simbologia da sua tumba!
Não, ela não queria no seu túmulo a coroa, espada ou símbolos reais, apesar de sepultada entre dois reis, o marido e o filho Ricardo II. Queria ficar deitada e a ler um livro. Queria ser lembrada como amante dos livros, com uma almofada para lhe levantar a cabeça e ler melhor. O rosto está sereno, com um leve sorriso. Sorri dos livros que vai lendo no além. Sorri para os amores que amou. Mas porque escolheu o livro e não a coroa, ela a Águia de Dois Reinos? Porque não a espada, ela que fora uma guerreira? Porque queria dar uma última mensagem: O livro e a cultura são mais importantes que as guerras ou as honras!
No Dia da Mãe quis honrar esta Mulher, ela foi uma das maiores figuras da História da Europa, uma Mãe/Avó da Europa! Esteve sempre muito à frente do seu tempo e conseguiu trazer o futuro para o seu presente no Séc. XII/XIII…