Autor

José Mateus

31 de 07 de 2021, 08:14

Colunistas

Primeiro, o mais importante

Gerir o tempo (e não só) transformou-se numa obsessão que me obrigou a muitas leituras à procura do melhor método para o fazer

Durante muitos anos fui produtor multimedia, quando ainda não havia as ferramentas digitais que hoje em dia aceleram muitos dos processos de produção, e debati-me frequentemente com volumes avassaladores de trabalho, poucos recursos e prazos muito apertados. Gerir o tempo (e não só) transformou-se numa obsessão que me obrigou a muitas leituras à procura do melhor método para o fazer. Foi assim que descobri um autor – Stephen Covey – e a sua obra de referência: «Os 7 hábitos das pessoas muito eficazes». Segundo ele, a nossa personalidade é constituída basicamente pelos hábitos que desenvolvemos, e depois de muitos anos de estudo e pesquisa criou um método que ajuda a desenvolver os hábitos principais que nos ajudam a atingir os objetivos a que nos propomos. Lembro-me regularmente de um desses hábitos, que utilizo nas tarefas do quotidiano – primeiro o mais importante – e agora que acabo de inaugurar uma exposição de trabalhos visuais meus (10 objetos nómadas) no Museu Terras de Besteiros, em Tondela, mais uma vez pude comprovar a sua eficácia.

O vice-almirante Gouveia e Melo também atua de acordo com aquele princípio: primeiro o mais importante. No outro dia ouvi-o numa entrevista, e fiquei a pensar que temos várias coisas em comum. Ele descrevia, com simplicidade, como era natural haver aquilo que chamou de ondas de vacinação. Se havia muitas primeiras doses para dar, avançava-se nesta faixa da população, e as da segunda dose paravam um pouco. Quando depois se avançava mais nas segundas doses, eram as primeiras que recuavam. Espero não estar a distorcer as suas palavras, mas parece-me que esta era a sua descrição do efeito de onda.

Mal ele pronunciou a palavra onda, lembrei-me logo de Hokusai, o famoso artista japonês especialista em xilogravura. Tinha uma obsessão pelo monte Fuji e como resultado das suas viagens criou uma série de “36 vistas do monte Fuji”, onde se inclui a sua obra mais icónica “A grande onda de Kanagawa” (1820-30). Na gravura vê-se claramente uma onda gigante e uma mais pequena a formar-se, mas entre elas avança um barco estreito e horizontal, aparentemente tranquilo.

Quem também tinha um ar aparentemente tranquilo era o Otelo Saraiva de Carvalho, que acaba de nos deixar. Os que o conheceram, gabam-lhe a grandeza de coração. Tenho a secreta esperança de que para preparar o 25 de abril de 1974 também ele atuou de acordo com aquele hábito: primeiro o mais importante.