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Por entre as ruínas do Castro dos Três Rios jovens estrangeiros tentam compreender a história de dois povos que afinal viveriam em paz
Por entre as ruínas do Castro dos Três Rios jovens estrangeiros tentam compreender a história de dois povos que afinal viveriam em paz
O sítio arqueológico do Castro dos Três Rios, em Parada de Gonta (Tondela) tem sido palco para a realização de trabalhos de limpeza e catalogação por 12 jovens, a maioria deles de origem estrangeira, com o intuito de aprenderem mais sobre arqueologia. O castro, que data da Idade do Ferro, tem sido local de investigação há vários anos, e os atuais investigadores veem-no como um marco no entendimento da assimilação cultural entre dois povos diferentes.
Localizado entre os rios Asnes e Pavia e a ribeira de Sasse – daí o nome do sítio arqueológico – o percurso para o castro não é de fácil acesso. Depois de descer um caminho de terra batida que o tempo tornou irregular, é necessário atravessar um dos rios através de várias pedras que compunham outrora uma barreira natural, e que agora, pela força do corrente da água, se encontram espalhadas pelo leito do rio. Depois de subir uma colina coberta de pequenas rochas e ervas secas já desbravadas, o castro, composto por várias secções do que outrora foram edifícios, situa-se no topo da colina.
“Este castro é algo de único no nosso concelho e na região centro, e é um castro cuja dimensão e localização permite criar aqui algo que diferencie, do ponto de vista arqueológico, aquilo que nós queremos que o nosso território do concelho de Tondela e que também seja no domínio da arqueologia e da valorização do património arqueológico”, assumiu a presidente da câmara de Tondela, Carla Antunes Borges, que esta terça-feira se deslocou, em conjunto com a presidente da junta de freguesia de Parada de Gonta, Sandra Santos, até este sítio arqueológico. “O contexto envolvente é fundamental e diferenciador, porque estamos numa zona que é claramente mais alta, envolta por três rios, daí o nome Castro dos Três Rios”, concluiu.
Mais do que conhecer o castro, conhecer novas línguas e culturas
Em cima e ao redor das ruínas do castro, várias mochilas e camisolas tinham sido espalhadas. Estas pertenciam aos jovens que se encontravam nesse local a trabalhar, com idades entre os 18 e os 30 anos. Uns de régua na mão, outros com um papel, lápis e borracha, catalogavam cuidadosamente as ruínas, e desenhavam, em escala, o sítio arqueológico. O grupo de trabalho de voluntariado jovem internacional é composto por quatro pessoas de nacionalidade portuguesa oriundas da Universidade de Coimbra, três pessoas de Espanha, uma de Taiwan, uma do México, duas de Itália e uma pessoa de França.
Ana Isabel Perez, jovem oriunda do México licenciada em ecologia, interessou-se pelo projeto uma vez que lhe permitia “entender o passado e como viviam as pessoas, e em ecologia também se procura entender o ser humano”. A jovem mexicana de 27 anos explicou que, no início, a integração no projeto foi “um pouco complexa”, dado envolver pessoas com línguas e culturas tão diferentes. “Mas com este trabalho começámos a enriquecer-nos e a conhecer um pouco não só de arqueologia, mas também sobre outras culturas.
Para Ferran Rocamora, estudante de física com 18 anos e natural de Barcelona, a participação no projeto permitiu um aprofundar dos conhecimentos de história e arqueologia. “Estamos a limpar os vestígios romanos aqui do castro”, explicou. “Eu procurei campos de trabalho internacionais e encontrei este aqui no castro, que me interessou e, por isso, decidi vir”, concluiu o estudante espanhol.
Menos espadas e conquista romana, mais assimilação e trocas culturais
Pedro Matos é um dos responsáveis pelos jovens arqueólogos, que estavam a “fazer trabalho de levantamento topográfico”. O investigador brasileiro encontra-se a desenvolver um doutoramento na Universidade de Coimbra coordenado por Conceição Lopes, responsável pelo Centro de Investigação em Arqueologia, Artes e Ciências do Património. Pedro Matos explicou que o sítio trata-se de “um povoado pré-romano, que já estava estabelecido aquando das chegadas dos romanos, e que assimilaram toda a cultura e o sistema económico trazido pelos romanos”. De botas, calções e t-shirt, o arqueólogo movia-se por entre as rochas onde se localiza o castro com a agilidade de quem o fazia há várias semanas, e que tomara a casa milenar praticamente como sua. “Essa assimilação manifesta-se no sítio arqueológico de várias formas em termos de arquitetura e de cultura material, e é isso que no futuro nós pretendemos esclarecer através dos trabalhos aqui realizados”, explicou aos jornalistas.
O castro parecia transportar os jovens numa viagem pelo tempo, até ao fim do império romano e o início da Idade Média, mas não é a única maravilha encontrada no topo daquela colina. Duas gravuras inscritas em pedra e viradas para a colina do lado oposto do vale representam o nome do que se pensa ser um cidadão romano e uma homenagem a duas divindades do povo nativo. “Estas [inscrições]são muito interessantes porque são em língua latina, de alguém que dominava a língua latina”, contou Conceição Lopes. “É uma inscrição interessante na medida em que ela faz esta relação ente alguém que chega de fora, porque o indivíduo é romano, com nome Malius, e que faz uma dedicatória a deuses das pessoas que aqui estavam”, esclareceu a arqueóloga.
A coordenadora do Centro de Investigação em Arqueologia, Artes e Ciências do Património explicou que o local seria propício para a realização de sacrifícios ou oferendas com animais, e com potencial de cerimónias. Já em relação a um contacto amigável e a uma dedicatória ancestral, Conceição Lopes considerou que as duas inscrições “são uma prova muito interessante desses contactos, porque não foram todos de ‘vou lá e conquisto à espadeirada’, há contactos que surgem de outro modo, e aparentemente este senhor romano queria fazer uma espécie de negócio ou manter alguma relação por interesse e acaba por dirigir-se a estas pessoas dizendo que vinha em paz”.
O campo de trabalho voluntário internacional é promovido pela Associação Desportiva Recreativa e Cultural de Parada de Gonta e pela junta de freguesia, com o apoio da câmara municipal de Tondela e do Instituto Português do Desporto e Juventude. Teve início no passado dia 10 de julho e terminará na sexta-feira, dia 21 de julho.