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VISEU, o mito da transparência contábil

 VISEU, o mito da transparência contábil - Jornal do Centro
13.09.25
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 VISEU, o mito da transparência contábil - Jornal do Centro

por
João Ferreira da Cruz

Muito se tem falado, nos últimos anos, da transparência na gestão autárquica. Viseu não é excepção.A cidade, frequentemente apontada como exemplo de boas práticas, surge em relatórios como o da plataforma internacional Dyntra com 65,22% de cumprimento nos indicadores de transparência económico-financeira, um valor bem acima da média nacional, que ronda os 35,78% entre os maiores concelhos portugueses. À primeira vista, seria motivo de orgulho. Mas será que esses números contam a história toda?

A verdade é que a transparência, quando reduzida à publicação de documentos técnicos em formato PDF, sem explicações claras, sem visualizações acessíveis e sem canais de participação activa, não passa de uma ilusão — uma imagem de rigor que pouco serve ao cidadão comum. E Viseu, infelizmente, não escapa a esta crítica.

O orçamento municipal para 2025 ultrapassa os 133 milhões de euros, dos quais cerca de 110 milhões são geridos directamente pela Câmara Municipal, e 24 milhões pelos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento (SMAS). De acordo com o presidente da Câmara, Fernando Ruas, trata-se de “um orçamento que assenta no rigor e na ambição”, apostado em áreas como a Educação, Habitação, Cultura e Ordenamento do Território. Segundo o autarca, “as receitas correntes previstas, de cerca de 80,4 milhões de euros, cobrem as despesas correntes, de quase 70 milhões, deixando margem para investimento”. Estes dados são animadores. Porém, para o cidadão que tenta compreender como e onde são aplicados estes recursos, a tarefa continua árdua. Os documentos estão disponíveis, sim — mas a forma como são apresentados continua excessivamente técnica, segmentada e, muitas vezes, impenetrável para quem não domina os meandros da contabilidade pública.

Hoje, a maioria dos municípios portugueses cumpre os requisitos legais de transparência: publica orçamentos, actas, planos, contas e relatórios. Mas isso basta? Claramente, não. A TIAC – Transparência e Integridade, Associação Cívica tem sido clara nesta matéria: a existência de dados, por si só, não é garantia de transparência. Sem mecanismos de explicação, simplificação e envolvimento, a informação pública corre o risco de ser invisível.

Em Viseu, os documentos são publicados, mas a sua apresentação raramente inclui resumos visuais, infografias, painéis interactivos ou dashboards por freguesia. E, mais grave ainda, não existe uma cultura institucional de escuta activa dos cidadãos. As decisões orçamentais são tomadas com escassa participação pública e pouca explicitação dos critérios que levam a priorizar uma obra ou um investimento em detrimento de outro.

Falar de transparência exige mais do que a publicação de documentos. Exige clareza. Exige utilidade. Exige diálogo. A informação deve ser compreensível, comparável, verificável e acompanhada de oportunidades reais para os cidadãos se envolverem nas decisões que os afectam.

Transparência é também capacidade de prestação de contas — e isso significa disponibilizar momentos regulares de balanço público, onde os eleitos apresentem resultados e estejam disponíveis para responder a perguntas da população.

Mas o panorama não é irreversível — longe disso. Há caminhos possíveis, e vários municípios já os percorrem com sucesso. Em Viseu, adoptar medidas que promovam uma transparência real, e não apenas formal, exigiria decisões simples mas impactantes. Desde logo, seria essencial que os relatórios financeiros fossem redigidos com linguagem acessível, acompanhados de resumos claros e elementos visuais — gráficos, infografias, esquemas — que ajudassem a traduzir os números para uma leitura compreensível por qualquer cidadão.

Além disso, a criação de plataformas digitais interactivas — como dashboards com dados por freguesia ou por área temática (educação, ambiente, obras públicas, entre outras) — permitiria uma monitorização próxima e actualizada da acção municipal. Estas ferramentas, longe de serem complexas ou dispendiosas, já são utilizadas noutros concelhos e têm demonstrado resultados muito positivos na aproximação entre a administração local e os munícipes.

Importa também reforçar os mecanismos de participação directa, com orçamentos participativos verdadeiramente vinculativos e processos de consulta pública antes da definição das Grandes Opções do Plano. Ouvir as populações nas fases iniciais da elaboração dos documentos estratégicos não é apenas uma questão de cortesia democrática — é uma exigência de qualidade da decisão política.

Por fim, a autarquia deveria instituir sessões públicas regulares de prestação de contas, com espaço efectivo para perguntas e respostas. A responsabilização não se esgota na publicação de documentos nem em votos de quatro em quatro anos. Requer presença, escuta, transparência no sentido mais profundo: tornar visível e compreensível aquilo que se faz com os recursos públicos e porquê.

Embora Viseu tenha cumprido formalmente os requisitos legais de transparência e apresente um orçamento robusto com cobertura de despesas correntes, há ainda espaço para reforçar a transparência substancial — ou seja, a que permite a compreensão real, participação e responsabilização.

Com as eleições autárquicas à porta, este é o momento ideal para exigir mais do que o mínimo legal. Os partidos e candidatos têm a responsabilidade de apresentar propostas concretas para uma governação aberta, próxima e responsável. Mas os cidadãos também têm um papel: recusar a passividade e exigir que os números deixem de ser uma cortina de fumo técnico para passarem a ser instrumentos de entendimento e decisão colectiva.

Viseu tem todas as condições para estar na linha da frente deste processo. Tem dimensão, recursos, estabilidade financeira e quadros técnicos competentes. Falta apenas dar o salto da transparência de fachada para uma verdadeira cultura de responsabilidade pública. E esse salto começa quando deixarmos de confundir uploads de PDFs com cidadania democrática.

João Ferreira da Cruz (antigo Vereador do PS na CMV)

Notas:

  • Dyntra (2025). Ranking de transparência das Câmaras Municipais portuguesas. Acesso em: https://portugal.dyntra.org
  • Jornal do Centro (2024). Orçamento de 133 milhões de euros para 2025 aprovado pelo Município de Viseu. Acesso em: https://www.jornaldocentro.pt
  • TIAC – Transparência e Integridade, Associação Cívica (2020). Transparência na Administração Local: boas práticas e desafios persistentes. Lisboa: TIAC.
  • Transparência Municipal – Dyntra Viseu (2025). Câmara Municipal de Viseu. Acesso em: https://portugal.dyntra.org/poi/camara-municipal-de-viseu
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