São 21 dias consecutivos, mais de 700 quilómetros e muito amor à mistura. Maria Coelho tem 55 anos, é praticante de trail e está prestes a fazer uma “prova” muito diferente de tantas outras que já fez. A assistente operacional no Hospital de Lamego vai percorrer a Estrada Nacional 2 a pé e o objetivo é só um: ajudar a pagar os tratamentos de Duarte, uma criança de quatro anos, autista, natural de Lamego.
“Serão 21 dias a caminhar a pé de mochila às costas e isto surgiu para ajudar o Duarte, filho de uma amiga minha. Decidi fazê-lo porque vejo o sufoco destes pais mensalmente e sabendo que os posso ajudar desta forma, foi só planear e seguir”, contou ao Jornal do Centro Maria Coelho.
A ideia é simples: “Pretendo vender cada quilómetro feito por mim, e por quem me quiser acompanhar em algumas etapas, a dois euros. Os quilómetros serão colocados na página do Faceboo diariamente e quem quiser ajudar pode ir à página e, por mensagem, pedir os quilómetros que quer comprar. Depois, envio o NIB, fazem transferência e após isso retiro do total os quilómetros vendidos com o primeiro e último nome de cada pessoa. No final e em direto é passado um cheque com a totalidade angariada, que reverterá a favor do Duarte para pagamento de terapias”.
Mensalmente, os pais de Duarte, Sofia Mendonça e Vítor Hugo Silva, têm um gasto de 1300 euros, entre terapia, combustível e portagens. A criança é acompanhada numa clínica e numa escola terapêutica em Penafiel. O esforço financeiro do casal tem sido grande e se não fosse a onda de solidariedade de conhecidos e, sobretudo, de desconhecidos “seria muito complicado”.
“A pessoas têm sido incríveis connosco, pessoas que não nos conhecem, que não conhecem o Duarte e são incansáveis. Se não fosse a ajuda de todos seria muito complicado”, confessa Sofia Mendonça, de 39 anos.
Maria Coelho é um dos exemplos solidários, mas são muitos os que têm ajudado esta família. “Já se fizeram rifas, caminhadas e outras iniciativas”, conta Sofia, que é natural de Avões, no concelho de Lamego.
O pai, Vítor Hugo, de 39 anos e natural do Porto, é quem garante os rendimentos para a família, estando Sofia dedicada a cuidar do filho. Quanto a apoios do Estado, “são poucos e não permitiriam que o nosso filho estivesse a fazer os tratamentos que faz”, contam.
Duarte foi diagnosticado com autismo aos dois anos. A mãe, Sofia Mendonça, percebeu mais cedo que algo não estava bem, mas a pandemia atrasou as consultas e o diagnóstico. Quando a certeza do autismo chegou, Duarte passou a ser seguido em Penafiel.
“O nosso filho não falava, não tinha reações, não interagia, hoje em dia é uma criança com algum autonomismo, que ri, conversa, interage e é por vermos a evolução dele e com o objetivo de o tornar o mais autónomo e feliz possível que todos os dias o levamos a Penafiel”, conta Sofia Mendonça.
Tratamentos que ficam dispendiosos, mas que são determinantes para a evolução do pequeno Duarte. “Já não consigo imaginar a vida do Duarte sem estes tratamentos, se ficássemos sem o poder levar seria uma frustração enorme”, desabafa Vítor Hugo Silva.
Sofia Mendonça conta que tem um sonho: criar em Lamego um espaço dedicado e de apoio a crianças autistas. “Era um sonho, porque não existem muitos locais especializados em autismo e estamos a falar de muitas crianças nesta região que precisam de ajuda e de ter tratamentos que os ajudem a evoluir e a serem crianças felizes e capazes”, conta Sofia.
Para já, as forças desta família estão concentradas no Duarte, assim como as de Maria Coelho. Isto porque, garante, “o grande objetivo é conseguir um ano de tratamentos”.
“Nunca fiz a Nacional 2 a pé, mas se mais para a frente me prometerem que compram novamente os quilómetros volto a fazer pelo Duarte. Não consigo voltar às costas aos meus. Sim o Duarte é meu de coração”, assegura.
Maria Coelho parte do quilómetros “zero” em Chaves a 31 de março e chega a 21 de abril a Faro, pela frente dias que não serão fáceis, mas há uma certeza: “O Amor pode tudo. Vou com fé, foco e força, vai ser difícil, mas nos dias difíceis é só pensar no sorriso e abraço do Duarte e logo recupero forças”.
Ao longo dos mais de 700 quilómetros, Maria Coelho vai ainda alertar e sensibilizar para o autismo. “Nas terras onde pernoitar e as câmaras me cederem um espaço irei ainda fazer um sessão de sensibilização sobre o autismo”.