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Gabriel Mondina
A União Europeia não colapsará de um dia para o outro. Se caminhar para a irrelevância, será um processo gradual, mascarado de estabilidade, até que um dia se perceba que já não dita as regras, mas apenas as segue. Outrora sinónimo de inovação, força económica e influência geopolítica, a UE vê-se agora num momento de definição.
Terá coragem para se reinventar e recuperar protagonismo global, ou resignar-se-á a um papel secundário, reduzida a uma mera entidade reguladora num mundo liderado por outras potências?
A crise de identidade da União Europeia é multifacetada. No plano estratégico, a dependência militar tornou-se inquestionável com a invasão da Ucrânia. A defesa da Europa continua atrelada à NATO, ou seja, à liderança dos Estados Unidos da América, um modelo que fragiliza a sua autonomia estratégica. A ideia de uma força militar europeia independente tem sido discutida há décadas, mas falta ação concreta para torná-la realidade. O novo compromisso de defesa mútua acordado no âmbito da Bússola Estratégica da UE constitui um primeiro passo, mas sem um orçamento militar europeu robusto e uma política de defesa integrada, a Europa continuará a ser uma potência de retaguarda, reagindo em vez de liderar. A UE pode continuar a ser um ator económico de peso, mas sem capacidade de projeção militar independente, permanecerá um interveniente de segundo plano no grande jogo do poder global.
O relatório Draghi aponta para desafios que não são meramente conjunturais, mas estruturais. A economia europeia enfrenta uma estagnação produtiva, uma burocracia pesada e uma estrutura regulatória que, embora proteja direitos e garantias, trava o crescimento e a inovação. O envelhecimento populacional e a falta de uma política migratória eficiente agravam a situação. Enquanto os Estados Unidos da América e a China disputam o domínio tecnológico com investimentos massivos em inteligência artificial, computação quântica e biotecnologia, a Europa continua demasiado presa a um modelo que prioriza a estabilidade em detrimento da disrupção. O fracasso do projeto GAIA-X, que pretendia criar uma infraestrutura digital soberana para competir com gigantes tecnológicos, exemplifica como a UE tem dificuldades em transformar boas intenções em avanços concretos. A inovação exige risco, algo que o modelo europeu tem evitado sistematicamente.
A crise energética expôs outra fragilidade central. A Europa, dependente durante décadas do gás russo, teve de improvisar rapidamente soluções de fornecimento alternativas, mas sem um plano energético a longo prazo que garantisse preços competitivos e segurança de abastecimento. Os Estados Unidos consolidaram-se como um dos maiores exportadores de energia, e a China lidera a corrida à transição para fontes renováveis, enquanto a Europa permanece dividida entre ambições climáticas erealidades económicas. A recente proposta de criação de um Mercado Europeu Integrado de Energia, embora positiva, chega tarde e com demasiadas barreiras nacionais ainda por resolver. A descarbonização é essencial, mas sem um plano que alie sustentabilidade à viabilidade industrial, a UE corre o risco de perder competitividade face a economias menos reguladas e mais agressivas.
No plano político, a fragmentação interna e o risco de paralisia institucional limitam a capacidade de resposta. O Brexit demonstrou que a contestação ao projeto europeu não é um fenómeno isolado. O crescimento de partidos eurocéticos em várias nações-membro indica que a coesão da UE não é garantida. A exigência de unanimidade para decisões fundamentais é um entrave evidente à eficácia do bloco, e sem uma reforma estrutural que permita processos mais ágeis, a Europa continuará a ser lenta na resposta a crises e desafios externos. O recente impasse na aprovação do Pacto Europeu de Migração e Asilo demonstra como a ausência de consenso impede avanços em temas cruciais para a estabilidade europeia.
Apesar dos desafios, a União Europeia ainda tem ferramentas para recuperar a sua centralidade global. Continua a ser o maior mercado comum do mundo, um líder normativo em áreas como proteção de dados e regulação ambiental, e um exemplo de cooperação multilateral. Mas essa influência regulatória não é suficiente para garantir o seu protagonismo. Para voltar a liderar, a UE precisa de três mudanças fundamentais: uma política industrial que aposte em inovação disruptiva, um modelo de decisão mais ágil e flexível, e uma estratégia energética que combine sustentabilidade com independência. Se o bloco europeu quiser ser competitivo face às economias emergentes, terá de ser capaz de fazer o que os seus concorrentes fazem há décadas: tomar decisões rapidamente e implementá-las sem burocracias sufocantes.
O futuro da União Europeia depende da sua capacidade de adaptação. O mundo não espera por aqueles que hesitam. A irrelevância da UE não será imposta de fora, mas decidida internamente, pela falta de ambição e incapacidade de reforma. Um exemplo recente dessa paralisia europeia foi a falta de resposta eficaz à Lei de Redução da Inflação dos Estados Unidos da América (Inflation Reduction Act), que atraiu investimentos globais ao oferecer incentivos fiscais e subsídios agressivos para a indústria verde. Enquanto Washington captava empresas e capitais, a Europa demorou-se em discussões prolongadas sobre como deveria responder, sem alcançar um plano unificado de contrapartida. Esta hesitação reflete o grande dilema europeu: o reconhecimento dos desafios é evidente, mas a ação concreta para enfrentá-los chega tarde ou não chega de todo. A Europa tem a escolha: assumir um papel central na definição da nova ordem global ou tornar-se um observador, refém das escolhas dos outros. A história mostra que quem não evolui, desaparece. Resta saber qual será a decisão europeia.
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