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O criador das Viseu Demo Tapes começou a tocar música nos anos 1990 em Viseu, e fez parte de bandas como os Dirty Coal Train ou os Funny Bunny. Ao longo dos últimos anos, dedicou-se a criar um repertório de projetos de punk, rock e experimentalismo do distrito de Viseu. Convidado inicialmente para a 9ª edição do festival Que Jazz É Este, Ricardo tem desde então dado a conhecer ao público viseense tesouros musicais que muitos pensavam perdidos, mas que o músico e radialista trouxe novamente à superfície. Já em relação ao presente, Ricardo assumiu sentir falta de mais divulgação de música viseense, e de um espaço que proporcione novos talentos.
Qual a sensação de poder fazer parte da rádio deste festival tão importante para o panorama musical de Viseu, e de trazer músicas que fazem parte de uma biblioteca pessoal não apenas sua, mas da própria cidade?
Já é o terceiro ano que a Ana Bento me convida para integrar o festival e para divulgar bandas de Viseu. Sempre tive gosto nesta parte do arquivismo, e acho importantíssimo nós conhecermos o que foi feito a nível de originais, sobretudo numa altura em que não havia nada, não havia apoios nenhuns, não havia estúdios nem havia praticamente lojas de instrumentos de algumas das bandas. Estamos a falar de 1982, 1983, 1984, e das bandas mais antigas que estão disponíveis no Bandcamp e que eu digitalizei. Isto foi uma coordenação e um trabalho de grupo entre mim e as pessoas que tinham rádio na altura. Infelizmente o Jorge Humberto, que foi um dos grandes impulsionadores da rádio de originais aqui da cidade, já não está entre nós. Depois temos ainda o Rui Gomes, o Tigrão, o Nuno Polónio, pessoas todas ligadas à rádio, assim como as bandas todas, e foi um trabalho conjunto. Eu acho importante quer seja reconhecer o que foi feito quando nem sequer havia meios, não havia estúdios de gravação, nem posses para grandes instrumentos, e também para se tirar daqui lições para o futuro, nomeadamente valorizar mais este espaço e os espaços que dão lugar a bandas de originais, porque eu acho que as bandas têm de nascer de algum lado, é preciso esse apoio, e a câmara já faz um esforço louvável uma vez por ano para fazer um concurso de bandas originais daqui da cidade de Viseu, o Sons à Solta, mas acho que é preciso mais. É preciso apoiar sítios como o Carmo81, o Endireita, o Teatro, que vão abrindo portinhas para as bandas de originais se apresentarem, e apoiar esse impulso criativo.
Então sente que falta esse tipo de apoio à criação musical?
Sinto que falta apoiar esses sítios. Acho que a programação do Carmo81 devia ter um apoio para este tipo de bandas, ou a própria câmara podia ter um local para as bandas ensaiarem e para incentivar jovens a fazer bandas. Tal como têm uma biblioteca disponível, tal como têm um centro de apoio à juventude com internet e por aí fora, acho que era interessantíssimo eles abrirem um espaço de ensaios para bandas e para miúdos sem formação musical, mas que com algum apoio estejam interessados em fazer bandas.
Criar algo semelhante a um estúdio de gravação comunitário?
Sim, exatamente, e até para miúdos que querem ter uma banda, mas que não sabem onde é que podem procurar outros elementos, e assim encontram afinidades ou experimentam simplesmente, indo lá umas horas. Eu tenho a experiência de amigos que têm estúdios e que têm esse apoio local, no Barreiro por exemplo, e têm um programa de incentivo à criação de originais. Os miúdos são incentivados não só a tocar, mas a criarem os seus próprios originais e a apresentá-los, porque nem todos têm as mesmas posses e acho que é uma iniciativa excelente.
Na perspetiva não só de músico e radialista, mas de cidadão de Viseu, como é poder ver um parque Aquilino Ribeiro transformado e adornado com tanta música, vida e artesanato, mas onde a música parece ser de facto fundamental?
Acho importantíssimo e que devia ser prática regular. O festival nos primeiros dias não é tão centrado no parque e espalha-se um bocadinho pela cidade e também acho isso importante, mas penso que aqui no parque podiam colocar sempre alguém a passar música. Eu ofereço-me desde já [risos] para estar aqui umas horas de vez em quando, nestes tempos em que apetece e sabe bem estar aqui no parque. Eu recordo-me na altura de 1980s e 1990s, em que havia aqui mais bandas de originais, em que havia um programa apoiado pela câmara, que era o Viseu Naturalmente, que se estendia durante meados de julho, mas também havia muito mais bandas de originais. Contudo lá está, impulsionando também aparecem mais bandas e as pessoas sentindo-se apoiadas e sentindo-se incentivadas e havendo um palco as coisas começam a acontecer mais frequentemente. Mesmo a nível de divulgadores de música, Viseu tem muitos, seja de rock, música alternativa, de dança, de techno e afim. Acho que é bom abrir um espaço e dar música às pessoas que vão passando no parque, música clássica até. Acho que é importante.
O que é que a seu ver diferencia a Rádio Rossio, do Que Jazz É Este, das demais rádios e programas associados a outros festivais?
Para já o ecletismo. Estar aqui uma pessoa de Viseu a divulgar desde música experimental a heavy metal, punk ou umas coisinhas com cheirinho a jazz, quando o grande cartaz do festival está ligado ao jazz, e a seguir, ou antes, poder ter um radialista completamente diferente a dar destaque a um género completamente diferente. É essa carta aberta que se calhar é o grande campo em comum com o jazz. A improvisação, em que não sabes o que é que vai acontecer, e neste caso eles abrem a porta para vir uma pessoa passar rádio e passar um género completamente fora da caixa para o resto do festival e isto acho que é louvável. Uma pessoa não tem de gostar só de jazz, não tem de gostar só de rock, ou de punk, e abrir o campo para isto tudo acho que é sempre um ponto positivo.
Como é que sente que é a receção e reação do público às Viseu Demo Tapes e a esta Rádio Rossio que passa no parque de um modo geral?
É sempre curioso, até porque como eu referi há bocado, as bandas mais antigas não tinham meios de gravação. Muitas das gravações são feitas na sala de ensaios ou gravações ao vivo, e a qualidade não é a melhor. É engraçado ver as pessoas a torcer um bocadinho o nariz, a estranhar o som, mas acho que depois também há quem valorize esse som de arquivo, e que me dizem “ah, mas este som lo-fi é que é mesmo o som daquela garagem”, e as pessoas que lá passaram horas e que viveram isso sabem perfeitamente que o som é mesmo esse. É nesse quebrar tabus que eu reparo mais, e depois é também um bocadinho aquelas letras em português que na altura os miúdos diziam, que são um bocado rebeldes e onde volta e meia sai uma asneira e é giro ver a reação das pessoas que estão aqui a passear e ouvem uma asneirita ou outra, mas riem-se e sorriem e continuam a beber a sua cerveja ou a tomar o seu café.