No coração do Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros, há…
Reza a lenda que foi um árabe, há mais de mil anos,…
Seguimos caminho por Guimarães, berço de Portugal e guardiã de memórias antigas….
por
Carlos Vieira
O declínio da empatia humana é um dos primeiros e mais reveladores sinais de uma cultura à beira da barbárie. – Hannah Arendt
No passado dia 14, foi inaugurada, em Viseu, na Rua D. Duarte, a cafetaria inclusiva “Docemente II”, um projecto da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM), que, como diz o seu presidente, Pedro Baila Antunes, pretende “ajudar a sentir o que é a essência humana”, e proporcionar uma “inclusão biunívoca” [recíproca]. Foi precisamente esse espírito de empatia que ficou patente com os utentes da APPACDM a participar na animação musical e no atendimento que continuará a ser garantido por eles, num ambiente acolhedor.
A mesma empatia que encontramos na APCV – Associação de Paralisia Cerebral de Viseu, que também faz um trabalho incrível de reabilitação, inclusão social e profissional dos seus utentes, garantindo-lhes direitos e oportunidades, nomeadamente, através do Centro de Atividades e Capacitação para a Inclusão, e, tal como acontece na APPACDM, envolvendo-os no cultivo e venda ao público dos produtos hortícolas da “Ria na Quinta” (espaço com estufas e loja na sua sede em Vildemoinhos), numa perspectiva de assegurar uma vida independente. Tem em curso a construção de um novo lar para acolher mais 30 residentes, para o que ainda lhes faltam 600 mil euros.
Empatia é o “eco-sistema” da APPDA – Associação Portuguesa para as Perturbações de Desenvolvimento e Autismo de Viseu, fundada em 1988, graças à dedicação de familiares de crianças e jovens com esses diagnósticos. Em 14.11.2014, apresentei na Assembleia Municipal de Viseu uma moção do BE, que foi aprovada por unanimidade, no sentido de apelar à Segurança Social para celebrar, com urgência, com a APPDA, um Acordo de Cooperação Atípico ou outro tipo de apoio que garantisse “a profissionalização e contratação de uma estrutura básica de recursos humanos de modo a assegurar a sua actividade regular com sustentabilidade financeira”.
Em Portugal há milhares de crianças com perturbações de desenvolvimento ou comportamento. No livro “Sentidos”,o neuropediatra Nuno Lobo Antunes, em co-autoria com a equipa técnica do PIN (Pró-Inclusão, da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial), elenca os diferentes diagnósticos (“do autismo à hiperatividade, da adição à internet à dislexia”), sintomas, tratamentos e o papel dos pais, cuidadores e educadores.
Ainda me lembro de notícias sobre uma prática que julgo já extinta: pais que prendiam os filhos com deficiências cerebrais em galinheiros ou os escondiam em casa. Na Roma Antiga, eram mortos à nascença; em Esparta, a supervalorização do corpo forte e belo, levava a que os deficientes físicos ou mentais fossem considerados sub-humanos e abandonados ou mortos; na Idade Média, eram considerados “castigo de Deus”, e se a Inquisição os condenava à fogueira como “encarnação do mal”, Lutero dizia que os loucos e idiotas eram seres “diabólicos”. Hitler, na sua obsessão por uma “raça pura”, autorizou o assassínio de crianças, jovens e adultos com deformidades ou paralisias cerebrais, que considerava degenerados, criando um método para “remover a vida indigna de vida”, em unidades de “eutanásia” que começou por sobredoses de morfina (mortes registadas como devido a sarampo ou outras doenças) e acabando, tanto na Alemanha, como na Áustria e na Polónia ocupada pelos nazis, com milhares de deficientes mortos a tiro ou pela inalação de monóxido de carbono engarrafado bombeado para o interior de camionetas onde eram trancados.
Derrotado o nazismo, deu-se uma lenta evolução. Só em 30.03.2007 é que
foi assinada na sede da ONU, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e protocolo adicional, que garante a “todas as pessoas com deficiência”, incluindo as “que têm incapacidades duradouras físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais” o “pleno e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais” e promove “o respeito pela sua dignidade inerente”.
Em Portugal há décadas que se dá atenção aos alunos com “necessidades educativas especiais”. Formaram-se professores de “Educação Especial”, mas não se deu formação aos restantes. Eu não tive essa formação quando fiz o curso de professor do 2º Ciclo. A disciplina de PIA (Problemas de Integração e Aprendizagem), que surgiu há mais de vinte anos, ajudava a ter umas noções muito básicas sobre autismo, dislexia, disortografia, discalculia e outras desordens neurológicas. Mas ainda faltam muitos meios humanos e materiais para uma verdadeira educação inclusiva. Os alunos que beneficiam de medidas adicionais têm alguma ajuda, mas há outros que ficam esquecidos, porque os meios não dão para todos. O Decreto-Lei nº 54/2018 pretendeu criar um sistema inclusivo, sem categorizações para não estigmatizar, abandonando a designação de “alunos com necessidades educativas especiais”, mas as “medidas universais” não são suficientes quando faltam docentes, técnicos especializados e “auxiliares de educação” (assistentes operacionais com formação específica).
Foi com estas preocupações que a deputada do Bloco de Esquerda, Joana Mortágua, levou ao Parlamento o problema da falta de professores e de técnicos especializados de Educação Especial e a necessidade de recuperar os auxiliares de educação, e outros recursos para o cumprimento da legislação, como as turmas reduzidas ou a “criação de um grupo de recrutamento da Intervenção Precoce na Infância”, já proposto pelo BE. Foi então que o deputado do Chega, João Tilly, eleito por Viseu, fez uma intervenção criticando o “excesso de professores de educação especial” e com esta “tirada”: “A educação ou o ensino especial é importante. mas o ensino geral é muito mais importante e esse está esquecido e ignorado. Afinal, nós somos um país de alunos com deficiência ou somos um país de alunos normais?”
Rosário Gamboa, do PS, respondeu que “as crianças são crianças; não há crianças normais nem crianças anormais”. A Associação Portuguesa de Deficientes exigiu um pedido de desculpas por parte do Chega. O Movimento Cidadão Diferente acusou o deputado do Chega de “insensibilidade e desconhecimento da realidade vivida pelos alunos com deficiência e suas famílias”. A Humanitas – Federação Portuguesa para a Deficiência Mental, segundo o Jornal do Centro, disse que o desrespeito do deputado “não pode ficar impune”. Também a FNE – Federação Nacional da Educação condenou a abordagem de João Tilly, por ser “redutora, simplista e desrespeitosa para com os alunos, pais e professores e demais profissionais” deste tipo de ensino. E a Fenprof divulgou uma nota no mesmo sentido.
Já no passado dia 13, a deputada Diva Ribeiro, do Chega, dirigiu-se à deputada do PS Ana Antunes (cega), que tinha apresentado propostas para melhorar a vida das pessoas com deficiência, dizendo: “É curioso que a Sra. deputada Ana Antunes só consiga intervir em assuntos que envolvem, infelizmente, a deficiência”. Após as diversas intervenções que se seguiram como reação a esta acusação, ouviram-se apartes da bancada do Chega insultando vários deputados e a chamarem “aberração” à deputada do PS. Estes insultos levaram o movimento de pessoas com deficiência, Centro de Vida Independente (CVI), a enviar ao Presidente da República, ao Presidente da A.R. e ao Primeiro-Ministro, uma carta aberta subscrita por 60 colectivos e mais de 700 pessoas a título individual, condenando as acusações e insultos à deputada apenas por ser uma pessoa com deficiência, “que constituem um acto de discriminação direta e objectiva, que resultam do capacitismo enraizado na sociedade, constituindo um crime de incitamento ao ódio e à violência, punível por lei”. Exigem que o presidente da AR não deixe passar discursos de ódio e discriminatórios, a pretexto da “liberdade de expressão”, e sanções para os seus responsáveis, que pretendem a exclusão da vida política e a segregação das pessoas com deficiências.
Para o partido de Ventura, “normais” devem ser os seus 15 deputados e dirigentes acusados e/ou condenados, segundo a Imprensa, por roubos (em casas, igrejas e aeroportos), prostituição de menores, agressões, destruição de carros e de correspondência, ofensas à honra, incitamento ao ódio e agressão a árbitro, violação de leis, falsas declarações em Tribunal, dívidas, “agredir e cuspir a ex-mulher do actual companheiro”. Ou João Tilly chamar “baleia” a uma militante do Chega. Tudo “gente de bem”. Gente “normal”, no Chega.
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