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por
Alfredo Simões
Onde quer que seja que nos encontremos, no País, é frequente ouvirmos alguém falar de Viseu como uma “cidade simpática”, “bem organizada” ou onde “se come bem”. Com frequência podemos ouvir referências ao Museu Grão Vasco, ao Fontelo ou a Viriato.
Viseu terá merecido a designação de “cidade com melhor qualidade de vida”, em comparação com as demais cidades portuguesas, e tem sido um dos “trunfos” mais relevantes que os visienses colocam em cima da mesa de jogo. Mas, tal como num jogo de cartas, temos de contar com a sorte vinda do baralho – o contexto externo, as politicas publicas nacionais/europeias que não controlamos – e na vida em comunidade é possível construirmos novos trunfos ou valorizarmos aqueles que já possuímos. Podemos valorizar “valetes” e transformá-los em “manilhas” ou criarmos, quem sabe, novos “ases”.
Para o efeito, Viseu precisa de continuar a atrair e saber gerir recursos em função de uma ambição que nos compete definir. É importante que os nossos projetos (pelo menos os projetos centrais da estratégia que precisamos de definir) tenham dimensão, pelos recursos mobilizados e pelo alcance conseguido, e a sua gestão (estratégica e operacional; política, económico-financeira, de comunicação, etc., etc.) seja de qualidade, eficaz e orientada por objetivos e não a navegar ao sabor dos ventos ou ao sabor de interesses pessoais, de grupo e não da comunidade.
À semelhança do que fizemos há 3 anos atrás, retomamos o título de um artigo de então, e voltamos a reincidir na apresentação de propostas que poderão parecer “missões impossíveis”. Também noutros textos, no JC, tivemos oportunidade de apontar para outros potenciais projetos sempre com a intenção de contribuirmos para o desenvolvimento da nossa cidade.
Viseu, cidade-jardim 2.0
Em 1933 terá surgido a primeira referencia a “Viseu, Cidade-Jardim” num cartaz turístico de Viseu*. Mas foram precisos muitos anos para que Viseu merecesse esta designação pois que, vinte anos antes, em 1911, um vereador camarário queixava-se do cheiro nauseabundo da maior parte das ruas da cidade. Na base da transformação ocorrida estará o capitão Almeida Moreira, 1º diretor do Museu Grão Vasco, mas também, entre outras atividades, vereador desde 1918 até 1934.
Estas referências, porém, não podem esquecer outras importantes intervenções, públicas e privadas, e, em particular, com alguns séculos de antecedência, o papel de D. Miguel da Silva, bispo de Viseu, que deve ser relembrado (por Viseu e por Portugal) pelo impacto que teve a sua ação no sec, XVI e, em particular, no desenvolvimento das oficinas de pintura de Vasco Fernandes, mas também do Paço Episcopal e Mata do Fontelo**.
Mas, o epíteto de “cidade-jardim” pode tornar-se insuficiente se a cidade de Viseu entender valorizar, como está ao seu alcance, todo o património natural existente (jardins, matas, quintas ,…) que resultou, ao longo de séculos, de cruzamentos com as Artes como a arquitetura, a pintura ou a escultura ou mesmo com o Desporto.
Por isso, talvez não seja uma “megalomania” irreal se pensarmos em “Viseu Cidade-jardim, 2.0” (precisamos de uma designação menos datada, mais mobilizadora e mais adequada à construção do futuro da cidade), multidisciplinar e polinucleada.
Com esta perspetiva, vale a pena pensar num plano de intervenção a começar no parque e mata do Fontelo (desde logo, com extensão ao Parque Linear, bem como a outros espaços verdes), sem esquecer o edifício do antigo Paço, mas também a valorização do passado associado à obra de D. Miguel da Silva que nos remeterá para uma parceria com o Museu Grão Vasco e com a Sé. Por outro lado, como já referi em artigos anteriores, a criação de um Jardim Botânico permitirá associar uma dimensão de conhecimento e de formação que serão fatores de dinamização de todos estes espaços que podem ainda beneficiar do uso de recursos digitais importantes para o dia-a-dia dos visienses e para alargar a notoriedade e o impacto de Viseu.
O desenvolvimento da “Cidade-jardim, 2.0” poderá ser feito enquadrado por um olhar sobre a cidade, um olhar como que vindo de um helicóptero, acima das nossas cabeças, e nos vá dando indicações de intervenções necessárias no âmbito do planeamento urbano.
Durante vários anos, enquanto formador de programas de formação dirigidos a técnicos e dirigentes municipais no domínio do “desenvolvimento local”, sempre apresentei, em sessões de norte a sul do País, Viseu como um bom exemplo de organização de uma cidade e nunca verifiquei reações contrárias. É uma convicção que mantenho, embora não sendo especialista urbano, mas tão só um observador e beneficiário da vida da cidade.
Viseu está organizada, ao longo dos anos, em torno do seu núcleo central dominado pela Sé, permitindo uma expansão ordenada e, de alguma forma, enquadrada, pelo menos nas últimas décadas, pela estrada da Circunvalação***. Naturalmente, o crescimento da cidade, através de circulares e radiais, já fez com que a Circunvalação tivesse sido ultrapassada. Porém, importa olhar para esta via estruturante e identificar se não estará a ser fator de divisão em alguns pontos entre o ‘interior da Circunvalação e o ‘exterior’.
Cada visiense terá a sua perspetiva sobre a cidade e há de ter propostas em concreto. Por mim, aponto alguns aspetos que me parecem relevantes para o futuro desta outra “cidade-jardim”:
Há três anos atrás foi apoiado pela Junta de Freguesia um projeto designado “Diagnóstico Participativo da Zona Histórica de Viseu”****, cuja metodologia vale a pena continuar a pôr em prática, seja para atualização e, especialmente, para o seu desenvolvimento – precisamos de fazer a cidade ouvindo as pessoas e os atores locais (nomeadamente comércio e serviços para os residentes), as suas sugestões e propostas, incentivando as suas iniciativas colaborativas e associativas; a cidade precisa de habitação, em particular para os jovens que queiram começar uma vida autónoma, e não apenas como veiculo de acumulação de património e riqueza. Ao nível de cada bairro ou polo residencial será importante adinamização da participação das pessoas na vida do bairro, pode ser necessária a criação de “centros comunitários” – espaços de socialização e de prestação de serviços de proximidade (saúde, p.ex.); uma política social local de mobilização de ‘voluntariado pela cidade’ e de recursos ao serviço de uma estratégia de mecenato cultural, científico e social;
Vale a pena pensarmos na possibilidade de juntarmos (numa parceria estratégica) o Museu Grão Vasco, a Sé e o Museu da Misericórdia (eventualmente outros) e criarmos no Adro da Sé uma Praça dos Museus. Com a colaboração da Câmara Municipal, será possível a organização de uma Programação articulada que se desenvolverá nos referidos espaços e também, quando necessário, no próprio Adro da Sé, ao longo do ano*****. A Praça dos Museus, ao associar recursos, pode desenvolver iniciativas, para além das programações individuais regulares, e ter uma política de comunicação única mais robusta, uma voz mais forte que seja audível pelo País fora. Iniciativas como os Jardins Efémeros podem dinamizar todo este espaço. A criação do Campus Universitário do Adro da Sé (ver artigo anterior no JC) tornará também a ESEV mais forte e parceira ainda mais relevante numa possível parceria no quadro da Praça dos Museus e do conjunto do Centro Histórico. Igualmente relevante pode ser o papel a desempenhar por uma estrutura como a USAVIS para a mobilização de uma vasta e diversificada rede de colaboradores voluntários;
Fazer a cidade com as pessoas, estabelecer parcerias, mobilizar os bairros/polos residenciais enquanto unidades de convívio diário, libertar a iniciativa dos visienses, criar politicas publicas locais de incentivo à ação, ter uma visão de conjunto (cruzando domínios de intervenção e evitando uma política atomista de projeto a projeto) para o futuro – serão algumas das palavras de ordem para construirmos uma cidade de referência no que respeita à integração de cada visiense, à atividade científica e ao desenvolvimento tecnológico, à vida cultural e comunitária. Se formos tudo isto, seremos muito mais do que uma “cidade-jardim” sem abdicarmos desse privilégio. Será isto megalomania?
NOTAS:
*Ver trabalho de Maria Leontina Fonseca, “Jardins da Cidade-jardim, Aformoseamento natural de Viseu”, publicado por Edições Esgotadas (2018).
** Sobre D. Miguel da Silva (c.1480-1556) consultar Rui Macário Ribeiro (http://arquivo.projectopatrimonio.com/habitar/documentos/DMigueldaSilva_roteiro.pdf)
*** Desenhada no Plano Geral de Urbanização, de 1935, e igualmente assumida nos planos locais desde o Anteplano de 1952, passando pelos mais modernos Planos Diretores Municipais.
**** Projeto realizado por Ana Condeço Simões no âmbito de estudos na Universidade de Salamanca.
***** A criação da Plataforma Cultural de Viseu – iniciativa que me parece ser útil para a comunicação de Viseu, desde que a CMV, ou outra entidade responsável, tenha um papel ativo de coordenação – pode ajudar na organização deste processo e, simultaneamente, na elaboração de um macro plano da vida cultural e mobilizador dos agentes culturais de Viseu cidade-região.
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