Geral

15 de 10 de 2021, 11:00

Diário

Bombeiros da região temem que incêndios de 2017 possam voltar a repetir-se

Deflagraram há quatro anos os fogos que acabariam por atingir o distrito de Viseu. Comandantes das corporações dizem que as condições não melhoraram e que falta investimentos para evitar mais tragédias

incêndios 2017

Fotógrafo: Foto de arquivo

Os comandantes das corporações de bombeiros de alguns dos concelhos mais atingidos pelos incêndios de outubro de 2017 na região de Viseu dizem que a situação piorou ainda mais com falta de meios e pessoal.

Todos os comandantes consideram que as condições nas corporações não melhoraram e que falta investimentos nos equipamentos, nos meios humanos, na floresta e no ordenamento do território.

Faz esta sexta-feira (15 de outubro) quatro anos que o inferno começou a descer à terra na região de Viseu, mas não só. Em outubro de 2017, o distrito foi um dos mais atingidos pelos incêndios que assolaram o país inteiro, nomeadamente nas regiões Norte e Centro, durante dois dias.

Em Tondela, o comandante dos Bombeiros Voluntários, Nuno Pereira, defende que nada de positivo se fez para melhorar o serviço dos bombeiros. O responsável diz mesmo que a situação piorou agora em comparação com 2017.

“Se fomos ver o que mudou em efetivos e veículos, foi nada. Continuamos na mesma. Os veículos estão cada vez mais desgastados e usados. Relativamente aos meios humanos, houve um aumento nalguns corpos de bombeiros e uma diminuição noutros”, afirma. Nuno Pereira acredita que, agora, “cada vez mais propício o surgimento de situações anómalas como as que surgiram em 2017”.

Em Oliveira de Frades, o comandante dos Voluntários pede novos equipamentos de combate aos incêndios. Fernando Farreca diz que as forças estão preparadas apesar de poderem ter de lutar contra o fogo, que classifica como um inimigo desconhecido.

O responsável entende que a preparação “continua a ser exatamente a mesma”. “Nós estamos disponíveis e preparados, mas falta-nos o melhor. Falta-nos meios novos porque os nossos já têm 30 ou 40 anos e falta-nos equipamento de combate novo”, afirma.

O comandante dos Bombeiros de Oliveira de Frades lembra que, caso os operacionais sejam confrontados com um incêndio semelhante ao de há quatro anos, não haverá “homens que cheguem para chegar a todo o lado” e o combate será novamente difícil.

“Isso está provado em relatórios que saíram sobre Pedrógão, onde há técnicos a dizer que aquilo era lutar contra o desconhecido. Por muita preparação que se tenha os Estados Unidos podem ter os melhores equipamentos do mundo, mas os incêndios lá são de 70, 80 ou 90 mil hectares. Agora, isso não quer dizer que as forças não estejam preparadas porque estão, mas com a dimensão do que houve em outubro de 2017, é difícil”, acrescenta afirmando ainda que, em situações extremas, não se consegue elaborar estratégias de combate.

“Com 50 bombeiros, oito freguesias e cinco carros de combate, haverá três freguesias que não vão ter carros de combate”, conclui Fernando Farreca.

Já o comandante dos Bombeiros de Santa Comba Dão, Hélder Mota da Costa, critica a falta de investimento público na floresta e defende que se voltasse a haver um fogo com as dimensões daquele que aconteceu há quatro anos, hoje as consequências seriam bem piores.

“A tragédia de 2017 não foi aproveitada para mudar o ordenamento da floresta e a paisagem e as coisas estão muito piores porque a floresta está num estado muito pior do que estava em 2017”, argumenta.

Hélder Mota da Costa lamenta ainda que grande parte das corporações de bombeiros não tenham conseguido melhorar os seus meios. “Se há corporações que eventualmente adquiriram algumas viaturas, foi com o apoio dos municípios ou com fundos próprios, mas a maioria não o fez porque não houve possibilidade de o fazer”, lamuria.

O comandante de Santa Comba Dão também não traça um bom cenário quanto aos recursos humanos, dizendo que há bombeiros que abandonam as corporações todos os dias por necessidade de melhores condições de vida.

Também em Mortágua, a perceção é de que tudo se mantém igual. “Em termos operacionais, pouco ou nada mudou. Tudo se mantém praticamente inalterado, embora haja talvez numa ou noutra corporação mais ou menos meios”, refere o comandante dos Bombeiros locais, Luís Filipe Rodrigues.

Mesmo assim, diz que agora a informação circula mais rapidamente do que acontecia em 2017.

“A informação de base e a informação previsional do que pode vir a acontecer flui com mais rapidez. E, de facto, aquilo o que faz a diferença para um incêndio como o que aconteceu em outubro de 2017 são as condições climatéricas e pouco há mais para fazer. Houve algum investimento maior em termos preventivos e estruturais no território, mas não o suficiente”, reitera.

Vouzela foi outros dos concelhos mais afetados pelos fogos na região. Também Joaquim Tavares, comandante dos Bombeiros Voluntários locais, adverte que, se um fogo de grande dimensão voltar a acontecer, as dificuldades de 2017 vão repetir-se.

“Continuamos com o nosso dispositivo normal. Agora, com as condições climatéricas que estavam naquele dia e se isso voltar a acontecer, os problemas vão ser idênticos”, remata.

Há quatro anos, chegaram a estar ativos mais de 400 fogos que destruíram várias casas e indústrias e cortaram estradas. Só na região de Viseu, morreram mais de uma dezena de pessoas vítimas dos incêndios, afetando significativamente concelhos como os de Carregal do Sal, Nelas, Oliveira de Frades, Santa Comba Dão, Tondela e Vouzela.

Ao todo, nos incêndios, morreram 51 pessoas. Cerca de 70 tiveram ferimentos. Arderam mais de 220 mil hectares de terreno.