A taróloga Micaela Souto Moura traz as previsões do Tarot, na semana…
Neste episódio de “A comer é que a gente se entende”, exploramos…
A taróloga Micaela Souto Moura traz as previsões do Tarot, na semana…
Pavilhão Multiusos de Viseu composto. Todos querem chegar ao título de campeão nacional individual de sala (indoor) de tiro com arco. Alinhada com o arco, Matilde Coelho prepara-se para atirar. O arco está posicionado. Matilde respira fundo, a mira está afinada. E… já está! Campeã!”. Poderia ser assim, em jeito de relato de futebol, e com a voz colocada, que um qualquer narrador poderia ter contado a vitória da jovem atleta de apenas 17 anos.
Viseu, 3 de março de 2024. Matilde Coelho tinha completado naquela altura, há poucos dias, 17 anos. E naquele dia venceu em Viseu um novo campeonato nacional de tiro ao arco. Sagrou-se campeã nacional sala – recurvo cadete senhora. Até agora somam-se dois títulos nacionais e um conjunto de medalhas: sete de ouro, cinco de prata e sete de bronze. Em apenas dois anos de modalidade. E tudo começou numa brincadeira, num campo de férias.
“Não fazia ideia de que uma das modalidades que ia ter era o tiro com arco. Experimentei e gostei. Lembro-me de tempos mais tarde, falar com a minha mãe e perguntar-lhe se sabia se havia algum clube de tiro com arco em Viseu. Pesquisámos e descobrimos o Grupo Arqueiros e Besteiros de Viseu. Comecei a ir, gostei e continuei”, conta. E assim começou uma história que tem somado sucesso atrás de sucesso. Em três campeonatos nacionais do seu escalão, Matilde Coelho nunca saiu sem medalhas. Foi terceira classificada na época 2022/23 em sala e tem dois ouros. O tal de Viseu, neste mês de março, e outro conquistado em Lisboa, há um ano, no campeonato de campo.
Dois anos volvidos e quando olha para os primeiros tiros, Matilde acredita que teve aquilo que costuma chamar de sorte de principiante. Neste desporto, o alvo tem várias cores. O centro é o amarelo. Depois tem vermelho, azul, preto e branco. E a primeira tentativa, foi logo parar no objetivo maior. A atleta viseense já fez provas dentro e fora de portas e, apesar das contrariedades que a prova em exterior pode trazer, não tem dúvidas de que é atirar ao ar livre que se sente melhor. “Gosto mais de campo”, confessa.
Em campo ou em pavilhão, Matilde Coelho é já hoje uma das maiores promessas do tiro ao arco português. É o treinador, Luís Duarte, quem o afirma. O técnico, que durante as provas assume o papel de incentivador, não tem dúvidas de que estamos diante de uma atleta com potencial para seguir ainda mais longe neste desporto.
Matilde tem características únicas, que podem levar a mais sucesso, garante treinador
“Demonstrou desde cedo ter uma grande predisposição para a modalidade. É metódica e é muito atenta. Este é um desporto que requer repetição de gestos e muita concentração. A atitude dela sempre nos levou a acreditar que poderia ter sucesso”, sublinha o treinador que acompanha Matilde desde que entrou no Grupo Arqueiros e Besteiros de Viseu. “Com o passar do tempo e das sessões e depois de passar para competição demonstrou ser uma excelente arqueira e atleta. E com o tempo só demonstra essas características cada vez mais. E com o tempo pode alcançar outros voos”, confia Luís Duarte. O técnico assinala que a atleta é “muito dedicada, calma e focada”, características que, defende tornam Matilde diferente dos demais.
Durante as provas, a jovem de 17 anos procura não perceber quantos pontos está a fazer. O mais importante é, assume, gerir bem as expectativas à medida que os lançamentos ao alvo são feitos. E quando as coisas não começam a sair de feição, a arqueira tem um apoio essencial. “O meu treinador ajuda-me a focar e motiva-me”, frisa. Na final de Viseu em que levantou um novo título nacional, Matilde recorda uma técnica que se revelou fundamental: o simples ato de respirar entre tiros. “Serviu para oxigenar os músculos e para me concentrar e estar a 100% no momento de atirar”, recorda.
Depois de ter entrado praticamente por acaso no tiro com arco, Matilde Coelho defende que a capacidade de ter pontaria é algo inato. “Nasce com a pessoa. Há quem vá experimentar e percebe-se umas têm mais jeito do que outras. Mas também é algo que se treina e dá para melhorar”, sublinha. No meio dos vários lançamentos ao alvo, há um sentimento comum: a ansiedade. A questão é como a saber gerir. “É muito relativo”, começa por dizer Matilde. “Temos de ter um grande apoio do treinador. No calor do momento não nos conseguimos aperceber de que estamos a deixar-nos levar pela emoção. Precisamos de pessoas que nos conhecem, que sabem como reagimos e que nos digam para respirar, para melhorar a técnica…”, sustenta.
Como que se estivesse a escrever um diário, Matilde Coelho diz que vai lembrar o último título nacional alcançado em Viseu como uma prova particular e reconhece que quando as competições decorrem em Viseu “normalmente sinto mais pressão”. “Tentei não pensar na possibilidade de desapontar Viseu, que este ano é cidade europeia do desporto. Havia um pouco mais de pressão. Não vou mentir. É não pensar nisso. Se estivermos mais calmos, é mais fácil atingirmos os objetivos”, reforça.
Emoções podem dificultar caminho do sucesso, mas os treinos ajudam a diminuir a ansiedade
O treinador Luís também tem a noção de que “a emoção e a ansiedade mexem com o atleta”. “Não tenho dúvidas. É um desporto muito intenso tecnicamente. Repetimos tudo ao último detalhe, mas o lado emocional mexe muito com o arqueiro”, frisa. “O fator emocional tem um peso muito grande, sobretudo no dia da prova. Este desporto, como é de repetição, requer que o atleta esteja bem e não se deixe levar pelas emoções. E isso é difícil. A linha de tiro mexe com o atleta. A ansiedade é ponto forte. Se o arqueiro se deixa levar pela ansiedade, os resultados não vão correr tão bem. Aprende-se a debelar isso”, garante.
E, por isso, há que trabalhar o fator psicológico. “Temos de mostrar que os objetivos podem ser ultrapassados e demonstrar empatia em relação ao arqueiro”, refere o técnico. E então, que palavras usar para transmitir calma e paz? “Mostro-lhe que tudo está ao nosso alcance e que apenas precisamos de estar atentos. É no treino que estas questões se trabalham. No dia da prova, o mais importante para um treinador é mostrar que está presente”, sublinha Luís Duarte.
Luís e Matilde treinam, por norma, três vezes por semana. Em períodos que antecedem provas importantes, o treino chega a ser diário. Mas o que mais tem espantado o treinador é o facto de a arqueira ter evoluído tão rapidamente, tendo apenas entrado no “mundo da pontaria” há apenas dois anos. “Não é muito normal haver uma progressão num tão curto espaço de tempo, mas graças às características e à atitude da Matilde é que os resultados também têm aparecido”, elogia. Matilde Coelho é este ano cadete. No próximo ano sobe ao escalão de júnior, primeiro ano. Para já, o treinador não tem dúvidas ao afirmar que a jovem de 17 anos é “uma das melhores atletas portuguesas em cadetes”.
Jogos Olímpicos estão na mira. Matilde promete muito trabalho
Agora a pergunta é: e o futuro? Matilde não tem resposta certa, mas ambiciona chegar mais longe. “Toda a gente me fala dos Jogos Olímpicos, mas acho que há muitos passos até lá chegar. Faço parte da seleção nacional e agora vai haver provas internacionais. Tenho de fazer os mínimos para participar nessas provas. Tem de ser passo a passo. E depois quem sabe um dia chegue ao desafio final, aos Jogos Olímpicos”, afirma.
A arqueira viseense reconhece que em Portugal tem estado bem classificada, mas olhando para a realidade internacional, “nos Estados Unidos, por exemplo, ficaria certamente a meio da tabela”. “Falta trabalhar muito mais”, assume. “É uma questão de esforço e de nunca perder a motivação. Mesmo que haja treinos que corram mal, é levantar a cabeça e continuar”, avança.
No clube, que é uma secção do Centro Social de Prime e que, nesta fase, tem oito arqueiros, com idades entre os 13 e os 35 anos, Matilde já tem referências e, garante-nos, ouve-as. “Há pessoas que são mais experientes na modalidade. O Rafael Oliveira, o Carlos Poceiro, a Maria Silva, que já foi campeã nacional. Quando vamos para provas fora de Viseu é ela que fica comigo no quarto e tranquiliza-me e dá-me força”, revela.
No caso de Maria Silva, a arqueira foi também feliz em Viseu, no mesmo fim de semana em que Matilde Coelho se sagrou campeã. Na divisão Barebow seniores Maria Silva ganhou o título nacional em Tiro com Arco. “Às vezes fico estupefacta com o facto de só há dois anos ter pegado num arco e tentado a minha sorte. Vejo que há pessoas na minha categoria que tentam há vários anos. Passou muita coisa em dois anos. Deve-se a determinação e à definição de objetivos. Mesmo que o progresso não seja muito, tem de existir”, reforça Matilde.
A Biologia é o sonho profissional, competir na Roménia é o próximo objetivo desportivo
Fora do mundo dos arcos, das flechas e dos alvos, Matilde Coelho é, como a maioria dos jovens da sua idade, uma estudante. “Estou no 11º ano. No Liceu a tirar Ciências e Tecnologias”. “Eu gosto de aprender. Não gosto da pressão dos testes, mas sempre gostei de estudar. Gosto genuinamente de Biologia. Procuro não me desleixar nos estudos e ter boas notas para o meu leque de escolhas ser maior, quando tiver de selecionar um curso superior”, assinala.
É na área da Biologia que se vê a trabalhar. Mas a via profissional ainda está por definir. Uma coisa é certa: a escola não é para deixar até porque pode significar um porto seguro. “Gosto de viver consoante o que for conquistando. Não quero deixar a escola de lado porque nunca sabemos o dia de amanhã. É preciso ter sempre um plano B. Profissionalmente ainda não sei bem. Gosto de Biologia, mas não sei o que gostava especificamente de fazer”, explica.
Se na escola é feliz e realizada, em casa, o ambiente permite harmonia para continuar a ganhar. “A minha família sempre apoiou muito. O meu pai reporta sempre as minhas provas nas redes sociais. Os meus familiares estão sempre a incentivar. Tive os meus irmãos, que moram em Portugal, a assistir à prova em que fui campeã em Viseu. A família é sempre um apoio de retaguarda. Aquecem-me as costas para me empurrar, para chegar à vitória”,
A mira está nos Jogos, como já reconheceu, mas como que de alvo em alvo, há campeonatos para “acertar”. Para o futuro próximo está na mira a ida ao campeonato europeu de jovens, em sub-21, que vão decorrer em junho, na Roménia. Para lá chegar, precisa de garantir 595 pontos. E há quatro provas pela frente. O recorde pessoal da jovem arqueira é de 545 pontos em provas de campo. Este domingo vai tentar ser feliz na primeira prova que vai decorrer em Lisboa. Seguem-se Tavira, Vila do Conde e Caldas da Rainha.
Matilde começou literalmente a atirar com a mão direita, no ano em que Viseu é cidade europeia do desporto. “Foi um ótimo começo. Agora vamos trabalhar para que consiga o mesmo tipo de sucesso para finais”, diz o treinador Luís Duarte. Se chegar à Roménia, fará a segunda prova internacional. A primeira internacionalização foi em Espanha, no ano passado. Os arcos estão prontos, as flechas, também. A modalidade espera novos sucessos da jovem atleta viseense. “Respira, Matilde. E vai”. Serão, provavelmente, estas as palavras do treinador. O desafio está aí. E bem lançado.