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Fragmentos de um diário: 24 de Maio de 1986

 O Cine Clube de Viseu comemora os seus 70 anos de vida com uma exposição documental na Casa da Ribeira
13.04.24
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Hoje acompanhei a mãe da Fátima às compras. Ela está adoentada, e o marido não tem paciência para estas tarefas, saindo cedo para a pesca. Foi um exercício de contemplação de cores, cheiros, texturas, volumes. E relembrei-me do comentário da Fátima a propósito da sua reflexão sobre os pequenos gestos do quotidiano. De como há várias maneiras de se viver esta proximidade tão rente ao básico, ao chão do dia a dia. Uma nasce de uma certa sobranceria, de uma pretensão falsamente intelectual de desprezo por atos tão basilares. Outra, resulta de um enfado pela rotina do que é necessário. Mas a Fátima referiu-se a uma outra perspetiva, a do encanto de se fazer estes gestos vulgares de escolha dos produtos expostos nas bancas numa disponibilidade de espírito diferente, com simplicidade, sem pressas, com uma atenção quase amorosa. Não se trata de despachar o encargo, de mau humor, como uma perda tempo. Antes com a visão de que fazemos algo de essencial, de precioso para o nosso bem. Como ler poesia, devagar, com atenção, é um ato de aprendizagem e de elevação da alma, assim também a escolha dos legumes ou da fruta é um ato poético de descoberta, de gozo, de atenção a algo importante da vida.
A senhora elogiou a minha paciência. Podia ter dito que tinha sido uma lição da filha. Mas não lhe disse. Achar-nos-ia malucos. Limitei-me a sorrir e a dizer que tinha sido um prazer. Olhou-me surpreendida. E fomos para casa com os sacos das compras. Acrescentei apenas que um dos sacos tinha um cheiro muito agradável, e elevei-o na medida do possível ao nível das narinas. Ela comentou que era onde vinham algumas especiarias, como os orégãos, os coentros, o manjericão. Fiquei esclarecido.
Colaborei no trabalho do almoço e, pela primeira vez, atento à prática da cozinha, ao jeito de se descascar uma batata, à mistura dos ingredientes, à prova repetida do gosto do que está ao lume. Até hoje, limitava-me a sentar e a comer. Às vezes, gostava, outras, não. Mas alimentar-me era apenas uma necessidade que fazia sem reflexão, como mais uma das banalidades diárias. Vivia de palavras, de literatura, o meu alimento era a poesia. O resto era desperdício de tempo. E, se calhar, estou errado. O que devo aprender é trazer a poesia do céu para a terra, misturá-la à matéria das coisas do quotidiano, corporizá-la.
E escrevi à Fátima sobre esta aprendizagem. Escrevi-lhe a contar que, tal como ela, aprendi hoje de como o infinito que se deseja deve-se desvelá-lo na finitude do ser. A poesia corre aqui ao nosso lado no que supúnhamos ser as insignificâncias da vida.

 O Cine Clube de Viseu comemora os seus 70 anos de vida com uma exposição documental na Casa da Ribeira

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